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Educar sem punições nem recompensas

Educar sem punições nem recompensas é um desafio para muitos pais e mães. Muitas de nós fomos criadas à base de palmadas e outros castigos físicos ou psicológicos. Modernamente, substitui-se o ajoelhar-se sobre o milho pelo cantinho do pensamento. Formas diferentes para um mesmo fim: fazer a criança sentir-se culpada, com medo ou com vergonha de algo que fez. Precisamos interromper este padrão familiar (e social) se queremos estabelecer uma relação de respeito mútuo com nossos filhos, baseada no amor, na empatia e na auto-responsabilização. Somos mais fortes, mais experientes, mais habilidosos: somos os adultos da relação. Precisamos usar nossa força e capacidades para proteger e cuidar, nunca para punir. 

Marshall Rosenberg, criador da Comunicação Não-Violenta, diz o seguinte sobre isso:

“É muito importante, para mim, mostrar aos pais o uso protetor da força e a diferença entre o uso protetor e o uso punitivo da força. (…) A pessoa que faz uso da força para punir está tendo um julgamento moralizador sobre o outro: ‘ele fez algo errado, ele merece ser punido e deve pagar pelo que fez.’ Eis o princípio fundamental da punição! A punição é o fruto de uma crença de que o ser humano é fundamentalmente pecador e pervertido, que só pode ser levado para o bom caminho através da penitência. Como se fosse preciso mostrar a ele o quanto é odioso por ter feito o que fez. O meio de fazê-lo cumprir a penitência consiste em puni-lo para que ele sofra por isso. A punição pode ser física: com uma palmada, por exemplo. Pode ser também psicológica: quando tentamos suscitar vergonha ou culpa na pessoa para que ela fique com raiva de si mesma.”

Quando estamos alinhados aos princípios que servem à vida, e que estão na base da Comunicação Não-Violenta, não partimos da ideia de que o outro é mau ou fez algo “errado” e que, portanto, merece ser punido. Ao invés disso, buscamos perceber quais são as necessidades presentes na situação e como cuidar delas, sem imaginar mocinhos e bandidos – sem a dicotomia de bem e mal, certo e errado, bons e maus, que nos leva, no limite, a ver o outro como inimigo que merece ser eliminado. As guerras estão aí para nos mostrar o ápice deste pensamento dicotômico.

O uso protetor da força repousa sobre pensamentos radicalmente diferentes. Não consideramos que o outro é mau ou que merece uma punição. Nossa consciência é inteiramente centrada sobre as necessidades vitais. Nós sabemos quais estão em perigo, mas não damos a entender que a criança está ‘errada’. Este estado de consciência representa, então, uma grande diferença entre o uso protetor e o uso punitivo da força. Há uma segunda diferença, estreitamente ligada à primeira: a finalidade que nos move. Enquanto nós utilizamos a força para punir o outro, nosso objetivo é de lhe fazer mal, de lhe fazer lamentar o que fez. No caso do uso protetor da força, nossa única motivação é de proteger as necessidades – e, com este fim, pode ser que seja necessário começar por empregar força – e a comunicação com fim educativo virá mais tarde.”

Portanto, o uso da força – da imposição de sua ação sobre o outro – pode ser necessário, às vezes, para proteger a criança. “No caso de não termos tempo de falar com uma criança que se comporta de uma maneira perigosa em relação a si mesma ou aos outros. Ou quando esta criança recusa o diálogo. Assim, quando uma pessoa adota um comportamento conflitante com alguma necessidade vital, como a de proteger a vida, e que a pessoa não quer falar ou não há tempo para conversar, nós podemos ser levados a recorrer à força. Mas aí é importante distinguir se nossa finalidade é proteger ou punir. Uma maneira de descobrir é verificar nossos pensamentos no momento que decidimos recorrer à força”, diz Marshall.

criança correndo no parque

Controlar o ambiente para não precisar controlar a criança: segurança para todos, sem punições.

“Citarei como exemplo uma situação que vivi com meus filhos quando eles eram pequenos. Nós vivíamos numa rua muito movimentada. Eles pareciam fascinados pelo que acontecia no terreno em frente, mas não sabiam ainda como pode ser perigoso atravessar uma rua sem antes olhar para os lados. Eu tinha certeza de que poderia ensiná-los sobre isso, desde que tivesse tempo suficiente para fazê-lo, mas entretempos eu temia pela sua vida. Era, então, uma situação na qual o uso protetor da força se justificava, pois eu não tinha o tempo necessário para fazê-los compreender que sua vida estava em perigo. Eu lhes dizia: ‘Se um de vocês correr pra rua, eu vou pegar e colocar de volta no jardim, onde eu tenho certeza de que nenhum carro vai esmagá-los”. Pouco tempo depois, um deles se esqueceu disso e começou a correr para a rua. Eu o peguei, o trouxe de volta e o coloquei no jardim. Meu objetivo não era punir: entre o balanço e o escorregador, tinha muito com que se divertir no jardim. Eu não estava tentando fazê-los sofrer. Eu queria simplesmente controlar o ambiente para cuidar de minha necessidade de segurança. Muitos pais e mães me perguntam: mas não corremos o risco da criança ver isso como uma punição? Se, no passado, você agiu da mesma maneira mas com a intenção de punir, se a criança com frequência sofreu comportamentos punitivos, aí sim, há grandes chances de ela ver sua intervenção como uma punição. Mas o essencial, para nós, pais e mães, é de estar conscientes desta diferença e nos assegurar que, se estamos usando a força, é no sentido de proteger, não de punir. “

 

Quantos “nãos” você diz por dia ao seu filho? Quantas vezes você tem impulso de bater ou gritar com ele? Será que ele está fazendo muitas coisas “erradas” ou apenas sendo criança, com sua curiosidade e natural falta de noção de perigo? Se você precisa dizer muitos nãos ao seu filho, talvez precise rever seu ambiente e verificar se ele está adequado à presença de crianças.

“Uma boa maneira de se lembrar a razão de ser do uso protetor da força é de notar a diferença que existe entre controlar a criança e controlar o ambiente. Quando nós punimos a criança, estamos tentando controlá-la fazendo ela lamentar o que fez, despertando vergonha, culpa ou medo. Quando usamos a força com o objetivo de proteger, buscamos controlar o ambiente e não a criança. Pretendemos, com isso, proteger a vida até o momento em que seja possível ter com o outro uma conversa com qualidade. É mais ou menos como se a gente instalasse mosquiteiros na casa para evitar as picadas de mosquito. Estamos recorrendo à “força” para proteger: controlamos o ambiente para não acontecer aquilo que não queremos que aconteça.”

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Abraços, de mãe para mãe,
Maristela

Todos os textos da sessão “Escrito à Mãe” do site cultivandocuidado.com bem como os textos do perfil no Instagram @cultivandocuidado são de autoria de Maristela Lima. Se estas reflexões fazem sentido para você, talvez elas sirvam também para suas amigas mães. Compartilhe com elas o link deste artigo e sempre cite a autoria. Assim, você valoriza o trabalho de uma mãe que escreve e apoia este trabalho, contribuindo para que mais mulheres se beneficiem e me motivando para que eu continue a oferecer às mães conteúdos importantes, gratuitos e de qualidade.

Entre mães, precisamos no apoiar.
Com amor e gratidão,
Maris.

This Post Has 3 Comments
  1. Maravilhoso, total sentido! Busco diariamente formas de me livrar dessas limitações p criar meu filho, ele tem um ano e muitas das vezes que me vejo tomando esse tipo de atitude, me sinto mal. Me aliviei ao entender a diferença sobre controlar o ambiente mas ainda passo por situações que depois de feito, observo e compreendo que poderia ter agido de uma outra maneira. Sem culpar externos, algo que deve ser mudado em mim mas que esta num processo. Gratidão pelo esclarecimento.

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